domingo, 15 de junho de 2008

Soninha Francine entra na disputa pela prefeitura de São Paulo


A vereadora e comentarista esportiva Sonia Francine Gaspar Marmo, a Soninha, deve ser oficializada hoje como candidata do PPS à Prefeitura de São Paulo. Ela tem 40 anos, é formada em cinema pela Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP, torce pelo Palmeiras e tem três filhas, a mais velha com 24 anos e a mais nova, com 11. Ex- apresentadora da MTV, ex-católica convertida ao budismo e ex-petista, é uma personalidade política que foge aos padrões: se expõe com franqueza tanto nas questões públicas quanto nas particulares.

Soninha foi demitida da TV Cultura em 2001, depois que admitiu em entrevista a uma revista ter fumado maconha. Também já contou que fez um aborto. Em 2004, quando a filha caçula teve leucemia, ela expôs publicamente seu drama (a menina se recuperou).

Ela rompeu com o PT por questões éticas, mas não se furta a apontar aspectos positivos na administração da ex-prefeita Marta Suplicy - assim como na administração de Gilberto Kassab (DEM). Na entrevista abaixo, fala sobre os problemas de São Paulo, aborto, gays e a esperança de uma virada política que a leve à cadeira de prefeita. Por sua indicação, a entrevista aconteceu numa padaria no bairro de Perdizes, onde mora. Soninha chegou pilotando uma moto.

Um dos principais temas desta campanha à prefeitura deve ser o caos no trânsito, que ameaça parar a cidade. Como pretende abordar o problema?

Há um fator cultural forte em torno dessa questão. O carro próprio é sinônimo de sucesso na vida. Existe uma publicidade pesada, além desse crédito maluco, para comprar carro em 90 prestações. Não se fala mais em carro para a família, mas para cada pessoa da família. Fazer o quê? Todo candidato vai dizer que é preciso melhorar o transporte público. Mas não adianta colocar mais ônibus na rua sem planejamento. Veja o caso da Paulista: se você passar lá agora, vai encontrar o corredor de ônibus parado. O melhor seria reduzir o número de linhas e fazer os ônibus andarem. Em outros lugares, é preciso criar linhas.

E o metrô?

É caro e demorado. Deveria ter sido feito com mais agilidade nas últimas décadas. Hoje precisamos de uma solução combinada, com mais metrô, mais obras viárias. A questão do trânsito é um mundo inteiro, que envolve um planejamento muito amplo. Temos ao nosso redor bairros e cidades da região metropolitana que funcionam como dormitórios, com baixíssima atividade econômica e equipamentos públicos e privados deficientes. Isso obriga as pessoas a se locomoverem para a região central de São Paulo: um êxodo diário de milhões de pessoas.

O que acha da idéia de reduzir o tráfego na área central da cidade com o uso do pedágio urbano?

Sou a favor. Numa cultura onde o automóvel é supervalorizado, as pessoas não usam seus veículos apenas por necessidade ou falta de alternativa. Usam porque estão acostumadas, porque não se dispõem a andar 200 metros até o ponto de ônibus, a esperar e a viajar ao lado de outras pessoas. Apóio mecanismos que desestimulem o uso do carro.

Não acha que é preciso primeiro melhorar o transporte coletivo, para depois restringir a circulação?

Os políticos falam isso porque têm medo da reação das pessoas. O pedágio urbano, porém, não é uma invenção política: é uma questão técnica. Ele desestimula o uso do automóvel onde você não pode se queixar da falta de oferta de transporte coletivo, que é exatamente o caso da região central.

Você é filiada a um partido pequeno, com pequena representação na Câmara. Não terá que fazer muitas concessões para governar?

Não há como ignorar que uma parte do Parlamento só irá apoiar o governo se os seus pedidos forem contemplados - e isso não tem nada a ver com o mérito das propostas. Eu acho possível dialogar, desde que as reivindicações atendam ao interesse público. Se o partido quer indicar alguém para um cargo público em troca do seu apoio, é preciso que o indicado tenha competência. Essa política do "dando que se recebe" está muito arraigada no País, mas tem de ter um limite. O Lula perdeu uma boa oportunidade de escancarar esse esquema quando se elegeu pela primeira vez, com grande apoio popular e simpatia da mídia. Talvez tivesse empacado em algumas realizações, mas teria peitado esse costume ruim. Se você cede, não adianta depois culpar o chantagista.

No jogo político, acha possível vereadores do PSDB apoiarem as propostas de um prefeito do PT, considerando a inimizade entre os dois partidos? Ou vice-versa?

Acho. Aliás, esse foi um dos motivos pelos quais saí do PT. A nossa bancada tinha uma assessoria técnica muito boa, de alto nível, que fazia análises profundas dos projetos em discussão. Mas encerrada a parte técnica, do mérito, vinha a parte da estratégia política, em que se ignorava tudo o que tinha sido dito e alguém concluía: "Vamos votar contra."

Você já admitiu ter fumado maconha. Isso lhe trouxe problemas?

Sim. Até hoje, em alguns lugares, ainda sou apontada como a maconheira. Mas não me arrependo do que disse.

E quanto à proposta de descriminação do aborto?

Apóio. Acho que isso não é assunto para polícia, delegacia e cadeia. É para ser tratado em outras redes, de saúde pública, educação. Isso não quer dizer que sou a favor do aborto. Pela minha prática religiosa - o budismo - não é admissível interromper o desenvolvimento de uma vida humana. Eu já fiz um aborto, numa época em que tinha deixado de ser católica e ainda não havia encontrado o budismo. Para mim a vida humana é um privilégio - porque o homem tem o poder de refletir sobre suas ações e não viver impelido apenas pelo instinto. Impedir o desenvolvimento dessa vida é uma agressão. Mas a lei que tenta impedir o aborto mais agride do que protege a vida. As conseqüências de abortos clandestinos estão entre as maiores causas de mortalidade materna no Brasil.

São Paulo tem a maior parada gay do mundo. Como vê as reivindicações desse movimento?

A melhor frase dos militantes é: "Nem menos, nem mais: direitos iguais." Você não precisa aceitar, concordar, mas deve respeitar os direitos dessas pessoas. Direito ao trabalho, à educação, a freqüentar os lugares públicos, a andar de mãos dadas com o namorado na rua sem correr riscos de agressão. O combate à discriminação tem de ser política pública.

Que marca gostaria de deixar de sua gestão, caso seja eleita?

Gostaria de deixar duas marcas. A primeira seria uma melhora na vida de pedestres e ciclistas. Hoje existem 300 mil pessoas, no mínimo, que já utilizam a bicicleta como meio de transporte. São 300 mil pessoas entregues a essa selva - e morre ciclista pra cacete. Pelo preço da Ponte Estaiada, que acabaram de construir, você faz um sistema cicloviário de 200 quilômetros na cidade. A bicicleta não polui, não aumenta o efeito estufa, não congestiona a rua, proporciona atividade física e melhora a relação das pessoas com o entorno.

Qual seria a segunda marca?

O fortalecimento da relação das pessoas com o poder local. Tem que fortalecer as formas de participação popular que já existem - como os conselhos de escola, de segurança, de saúde - e criar outras, com representantes eleitos pela comunidade. É o que se chama de ética da co-responsabilidade. O discurso que se ouve há muitos anos é: cobre o político no qual você votou. Só isso? É preciso mais. É preciso saber o que você vai fazer pela cidade na qual você vive.

Você acredita que pode ganhar ou está se cacifando para o futuro?

Entrei com vontade de ganhar. Mas sei ler as tabelas das pesquisas eleitorais. Por outro lado existe a possibilidade de influenciar o debate eleitoral e até os rumos da próxima administração.

Lá no fundo, alimenta a esperança de uma grande virada?

Surpresas acontecem. Ninguém acreditava na Luiza Erundina quando ela se elegeu prefeita. E lá nos Estados Unidos? Pouca gente conhecia Barak Obama.

Com informações do O Estadão



Nenhum comentário: